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Fim das companhias estaduais?

 

As 26 companhias estaduais de saneamento básico, que prestam os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário à cerca de 3.600 municípios, envolvendo uma população de cerca de 110 milhões de brasileiros, estão ameaçadas de extinção. Uma delas, a SANEMAT, do Estado de Mato Grosso, já foi desativada, com seus ativos pulverizados entre os 117 municípios por ela antes operados.

A CESAN, no Espírito Santo, deverá seguir caminho complicado, envolvendo um processo de municipalização, pelo qual na grande Vitória, a produção de água e o tratamento de esgotos ficam com o estado e a distribuição de água e a coleta de esgotos, com os municípios. Com isto as receitas ficam com os municípios e as despesas com o Estado, enfim, a CESAN deve também evaporar.

No Rio de Janeiro, a CEDAE está sendo retalhada não somente por municípios, mas também por distritos, com está ocorrendo na capital.

No Amazonas, a COSAMA, perdeu a capital, na qual surge a empresa municipal que já foi privatizada. Os demais, cerca de 60 municípios, dificilmente terão condições de ter os serviços sem aporte de recursos do orçamento do Estado.

Na Bahia, EMBASA prepara-se para sua privatização, financiada por recursos federais, porém, dificilmente escapará de desmembramento, principalmente, de Salvador. Em Pernambuco, o processo é semelhante ao da Bahia, a COMPESA prepara-se para ser privatizada, com possível desmembramento de Recife.

Em Minas Gerais, a COPASA projeta a sua privatização para o ano 2001 e já conta com a participação privada; não temos informações a respeito da reação dos principais municípios, inclusive a capital, mas são também prováveis alguns desmembramentos.

Nos demais estados, as pessoas direta ou indiretamente envolvidas com o setor preocupam-se com a situação, de forma mais acentuada, depois de tomarem conhecimento do projeto de lei do deputado federal Adolfo Marinho, do Ceará, patrocinado pelo Governo Federal, que articula a fusão dos demais projetos sobre o mesmo tema em torno daquele acima citado que em tese consagra aquilo que em tom jocoso é chamado de "o modelo matadouro" ou mesmo "modelo açougue", segundo o qual "a carne fica com o privado e o os ossos com o estado".

Assim á facilitada a passagem dos serviços de saneamento básico (água e esgoto) para a gestão privada; pela separação dos municípios que têm maior rentabilidade, de modo que os deficitários ou de menor atrativo econômico passariam a ser ônus do estado. A pulverização das 26 companhias estaduais de saneamento em 3.600 entidades municipais teria como primeiro efeito a perda da escala econômica. Em particular, os custos fixos do sistema aumentari8am com a troca de 26 administrações centrais por 3.600, com repercussões econômico-financeiras que necessariamente serão repassadas nos valores tarifários.

Para ilustrar a perda de escala, cita-se o relatório do Banco Mundial da sua "Water and Sanitation Division", preparado por John Briscoe, sob o título "Setor de Saneamento Básico da Alemanha: Como funciona e o que significa para os países em desenvolvimento".

O relatório é resultante do trabalho de vinte membros de sua equipe técnica que visitou a Alemanha em outubro de 1994. Parte do relatório é sobre saneamento básico da antiga RDA, extinta no processo de unificação na qual os serviços de água e esgoto eram administrados por empresas regionais denominadas WAB. "Após a reunificação, os municípios da Alemanha Oriental sentiram que receberam de volta a responsabilidade pela criação das WAB, que lhes tinha sido tirada sob regime comunista." Atualmente as WAB não existem; cada município, mesmo os menores, criaram empresas municipais de água e esgoto, alguns entregues à gestão privada.

"Havia 15 WAB na RDA; atualmente, há cerca de 600 empresas municipais..."

O resultado disso nas tarifas foi muito intenso, para um país que já era o de maior tarifa do mundo em água e esgoto; na área da Alemanha Ocidental é de US$ 3,50 (6 DM) por metro cúbico, enquanto que na antiga área da Alemanha Oriental é de US$ 8,75 (15 DM), portanto 150% maior.

Se compararmos com as tarifas praticadas então, pela RDA, ocorreu um aumento médio de cerca de 20 vezes. Não temos dúvidas que, no limite, conseqüências semelhantes terá o Brasil, se a implosão das companhias estaduais ocorrer, após aprovação desse projeto de lei que estabelece a municipalização total, deixando para as companhias estaduais, onde existem regiões metropolitanas, o encargo da produção de água e tratamento de esgoto. Isto é, como disse o governador de São Paulo, deixar a receita com os municípios e as despesas, com o estado. É muito provável que essa "despesa" seja um conta muito alta a ser paga pelos estados e pela própria União, porque , dos 5.500 municípios brasileiros, apenas cerca de 300 são atraentes para a iniciativa privada.

Se as companhias estaduais não conseguirem pelo menos manter a capital dos estados na sua área de operação, elas estarão fadadas ao desaparecimento, com repercussões negativas, na competência técnica conquistada ao longo de quase 30 anos, exatamente pela escala econômica que a isso permitiu.- ABES INFORMA – Números 5 E 6, Maio/Junho 2000 -

 

Nota: Este artigo foi publicado em 2000 e repaginado em 03/01/2020, mantendo-se a formatação original do texto.

 

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